"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Tecnologias na educação

O QUE JUSTIFICA A ADOÇÃO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS NA EDUCAÇÃO?
Luciana Maria Allan

Vivemos um momento muito especial na história da humanidade. Momento este marcado pela invenção de uma tecnologia que vem revolucionando a forma como acessamos informação, nos relacionamos uns com os outros e organizamos nossas atividades diárias.
Quando pensamos em tecnologia, a primeira coisa que nos vêm à cabeça é o computador. Mas, muitas outras coisas são tecnologias. Como exemplo: a televisão, o avião, o livro, a lâmpada e o liquidificador. Enfim, milhares de recursos que fazem parte do nosso dia a dia e que nos ajudam a executar nossas tarefas, seja na vida pessoal ou profissional.
Situações como esta, não são novas. Se olharmos para trás, lembraremos de muitas outras tecnologias que já revolucionaram, em algum momento, a história da humanidade. Por exemplo: a prensa. Inventada em 1439, ela mudou a forma como registramos a informação. Antes de termos este recurso à disposição, muito se perdeu da história da humanidade. E a geladeira? Inventada em 1857 revolucionou a forma como armazenamos os mantimentos. Sem ela, era necessário salgar carnes e era quase impossível armazenar alimentos perecíveis. E o telefone? Inventando em 1856 foi um recurso revolucionário. Até pouco tempo, para fazermos uma ligação tínhamos que nos dirigir a uma cabine telefônica para solicitar a chamada. Hoje, já temos mais celulares no Brasil do que o número de habitantes.
Muitos outros recursos poderiam ser mencionados. O fato é que hoje, muitas destas tecnologias já estão incorporadas na nossa rotina e, na maioria das vezes, nem percebemos quando as utilizamos. Ninguém para, por exemplo, para pensar o que fazer e como utilizar, uma caneta ou um fogão ou um quadro negro na sala de aula. Mas, pode ter certeza, que algum dia, alguém já parou e refletiu sobre elas.
Mas então, que tecnologia é esta que está mexendo conosco e alterando a nossa rotina?
Provavelmente, você pense que é o computador... Mas, não! Na realidade a grande revolução tecnológica da nossa época é a Internet. Você já parou para pensar como vivíamos antes do advento desta tecnologia e como vivemos agora? Consegue lembrar de mudanças significativas na sociedade e na economia?
Vejamos, por exemplo, o que mudou com o comércio eletrônico. Até pouco tempo, quando precisávamos comprar um eletrodoméstico era necessário perder uma manhã de sábado visitando várias lojas de departamento para fazer pesquisa de preços, enfrentar horas em uma fila para abrir um crediário e esperar, por vários dias, para receber o produto em casa. Hoje, é possível acessar a Internet, visitar sites que fazem pesquisa de preços, verificar onde o produto está mais barato, ver a avaliação que outros consumidores fizeram do produto e, este mesmo site, já te remete para a loja escolhida, onde a compra pode ser feita com um cartão de crédito. Com o pagamento efetuado, o produto é encaminhado pela loja para qualquer lugar do Brasil em pouco tempo.
Outro exemplo: o governo eletrônico. Hoje é possível tirar certidões pela Internet, agendar para tirar documentos e até entregar imposto de renda pelo celular, evitando filas.
Como último exemplo, considerado uma grande revolução, temos a telemedicina. Comunidades ribeirinhas do rio Amazonas têm sido beneficiadas com atendimento médico emergencial, com suporte de um computador e acesso à Internet. Antes de ter esta tecnologia à disposição, moradores destas comunidades tinham que se deslocar até 7 horas de barco para chegar ao centro urbano e poder passar por um atendimento médico.
Não são bons exemplos do quanto a Internet está revolucionando a sociedade? Agora, olhemos para a Educação? Você consegue lembrar de alguma mudança significativa que ocorreu na área educacional com o advento das tecnologias digitais, mais especificamente do computador e da Internet?
Provavelmente não, pois as experiências inovadoras ainda são poucas e ocorrem de forma muito tímida e pontual. O fato é que estamos tentando trazer estes recursos para dentro de um sistema tradicional de ensino, que segue um calendário agrário, ou seja onde as oportunidades de aprendizagem começam em meados de janeiro e se encerram no final de novembro, dentro de um tempo industrial, ou seja, todo mundo aprendendo a mesma coisa ao mesmo tempo e dentro de um currículo medieval, com uma preocupação de se ensinar “tudo” a todos. Mas, o que é este “tudo” quando temos a informação disponível em diferentes mídias e sendo atualizada permanentemente?
Seligman & John em 2009 já nos diziam que entre 1954 e 1984 foi produzido mais informações que nos cinco mil anos anteriores. Em 1984 calculava-se que os textos científicos duplicavam a cada cinco anos e meio, em 1990 a cada 20 meses e em 2004, a metade dos cientistas que já viveram sobre a Terra estava vivo e produzindo conhecimento.
Com o advento das tecnologias digitais, novas gerações também surgiram. A primeira delas, que faz parte do período de disseminação da Internet, é a Geração Y nascida entre 1975 e 1995. Esta geração não nasceu com as tecnologias digitais à disposição, mas ainda na juventude foi exposta a elas, o que fez com que se familiarizassem facilmente. Esta geração não está mais cursando a Educação Básica são jovens que já estão no mercado de trabalho e que têm características bem marcantes:
• são questionadores;
• adoram desafios; e
• necessitam ser avaliados constantemente.
Caso tenha acesso à Internet, sugiro que vejam o vídeo “Todos queremos ser jovens” disponível em (https://youtu.be/3j0R6IHveqs).
A última geração, nascida após 1995 e chamada de Geração Z, é aquela que já nasceu impulsionada pelas tecnologias digitais. São os chamados nativos digitais e que hoje são nossos alunos! Para eles, zapear é o verbo. Não usam mais e-mails e são capazes de interagir com diversas tecnologias ao mesmo tempo. Estudam assistindo TV, navegando na Internet, ouvindo música e trocando mensagens de texto pelo celular.
As pesquisas da Neurociência, mais especificamente da Neuroeducação, têm nos dado dicas de como pensam, agem e aprendem estas crianças e jovens. Brandão (2005) já dizia que “As novas tecnologias trazem novas formas de operar a leitura e a escrita e novos modelos mentais”. Esta afirmação é confirmada quando pensamos na Internet. Sua linguagem é hipertextual, possibilitando que ao clicar em um link em uma página, sejamos remetidos para outra página, com outra informação e lá, provavelmente poderemos clicar em outro link e ter acesso a outras informações. Neste processo, o pensamento deixa de ser cartesiano e sequencial e passa a funcionar por meio de conexões.
Também encontramos pesquisas que nos mostram que hoje processamos informações mais rápido que há 20 anos; que as crianças aprendem muito mais pelo visual, chegando a ter o córtex visual 20% mais largo, que respondem bem a vários estímulos, mas refletem pouco. Os jogos de videogames também têm se mostrado recursos interessantes, mas que sem a intervenção do professor, não contribuem para que elaborem pensamentos em termos cognitivos mais altos. O simples fato de disponibilizar um vídeo, de ter acesso a um site da Internet ou a um jogo educativo, não quer dizer que os alunos aprendam. O professor precisa mediar todo este processo, levando os alunos a refletir sobre as oportunidades de aprendizagem.
Outro aspecto que é importante refletir, quando estamos avaliando a importância de criar oportunidades de uso de tecnologias digitais na Educação, é qual o objetivo final da Educação. Está nas primeiras páginas dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) é objetivo final do Ensino Médio preparar o aluno para dar continuidade aos seus estudos, ingressar no mercado de trabalho e exercer sua cidadania. Se isto é fato, é preciso olhar para todos os graus de ensino e analisar se nossas estratégias têm sido eficazes.
Em pesquisa recente realizada com 63 presidentes de grandes empresas, os mesmos mencionaram que buscam jovens que saibam se comunicar bem pela oralidade e pela escrita, tenham um bom raciocínio lógico, que saibam pesquisar, se relacionar bem, usar tecnologias, administrar bem o tempo, preservar o meio ambiente e fazer trabalho voluntário. Ou seja, muito mais do que pessoas com conhecimento técnico, as empresas estão buscando pessoas que tenham atitude, iniciativa, criatividade e resiliência. Sendo assim, perguntamos: em que momento a organização de nossas estratégias de ensino suportam estes novos desafios?
Também vemos com frequência informações dizendo que já somos a 6ª economia mundial e que temos grandes oportunidades: eventos esportivos, oportunidades na área de mineração e pré-sal. Mas, ao olharmos alguns dados, ficamos extremamente preocupados:
Brasil está em 88º lugar em Educação, atrás da Argentina, Chile, Equador e Bolívia. (UNESCO, março de 2011);
Brasil é o 84º no IDH, atrás do Chile (44º), Argentina (45º), Uruguai (48º) e Cuba (51º) e 73º em desigualdade social. (PNUD, novembro de 2011); e
A média do Brasil das avaliações aplicadas nos anos iniciais do ensino fundamental foi de 5,0, nos anos finais, 4,1 e no Ensino Médio, 3,7. A média dos países desenvolvidos é 6 – índice definido como meta para o Brasil atingir em 2022. (IDEB, 2011)
Ou seja, o Brasil está sim cada vez mais rico, mas as oportunidades de aprendizagem são poucas. Tudo isso porque nossos alunos não estão aprendendo. O que é mais crítico é que 40% abandonam a escola por falta de interesse (FGV 2009).
Então, se queremos alcançar nossos objetivos, ou seja, criar oportunidades para que nossos alunos aprendam, sigam seus sonhos, deem continuidade aos seus estudos, trabalhem e constituam família, precisamos repensar:
• o currículo que estamos trabalhando, sendo capazes de identificar os conteúdos que são relevantes e façam sentido para os alunos;
• as estratégias de ensino de forma que elas sejam mais instigantes, desafiantes, coloquem o aluno no centro da aprendizagem e colaborem no desenvolvimento de suas competências e habilidades básicas para serem sujeitos mais participativos na sociedade contemporânea;
• os recursos que deverão apoiar estas iniciativas e aí, nem sempre o computador é o melhor. A escola tem muitos outros recursos que são extremamente interessantes. É muito importante ter claro qual é o objetivo de aprendizagem, para então se pensar qual é a melhor estratégia para suportá-la. Ao adotar tecnologias digitais sem ter um objetivo muito claro, corre-se um grande risco de se otimizar o péssimo, ou seja, aquilo que já não era bom, torna-se ainda pior e aí sim, os alunos farão uso dos recursos disponíveis da forma que quiserem, inclusive acessarão sites inadequados na Internet. Os alunos são nativos digitais e sem uma proposta clara, eles têm fluência para fazerem o que acharem mais interessante. No entanto, se há clareza dos objetivos educacionais e da proposta de trabalho, os alunos não terão tempo para fazer o que não devem e se envolverão com o trabalho proposto, mediado pelo professor – ator, quando qualificado, indispensável ao processo educacional.
Com advento da Internet e dos dispositivos móveis, é urgente repensar as estratégias de ensino de forma que atendam as necessidades da Geração Z e da sociedade contemporânea. Uma boa prática para suportar estes desafios é a Aprendizagem baseada em Projetos. Com apoio desta estratégia, os alunos poderão ser envolvidos em processos de ensino suportados por Boas Perguntas.
A avaliação e devolutiva aos alunos também é uma constante nestes momentos, extremamente importante e valorizada por esta geração.
Nas estratégias de aprendizagem organizadas neste formato, você (professor) precisa aprender a aprender, inclusive com seus alunos, se apropriar de recursos tecnológicos digitais básicos e não se preocupar caso eles saibam mais do que você (isso acontece em 90% das vezes). Sugerimos também que participe de comunidades virtuais que discutam questões relacionadas à adoção de tecnologias digitais na educação, repense sua prática e planeje muito! Somente assim, você será capaz de organizar as melhores estratégias de aprendizagem que tenham como foco uma Educação de qualidade.
Para encerrar, trazemos uma frase de Jean Piaget, que apesar de ter sido escrita há tempos, ainda reflete o que esperamos da Educação:

“A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe.”